Entrevista: Mercedes Rosende

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Quantos escritores policiais uruguaios você conhece? E escritoras? Se está procurando as respostas, conheça Mercedes Rosende, que já foi apontada como a pioneira do gênero naquele país. Autora de quatro livros, entre eles Demasiados Blues e La Muerte Tendrá Tus Ojos, tem se destacado na cena literária do Mercosul. Por e-mail, Mercedes respondeu as perguntas de Anisio Homem, autor de O Homem que Mutilava Leminski e de O Diabo não Aperta o Gatilho. Os autores vão acompanhar o festival literário BAN! – a Buenos Aires Negra – que começa em 31 de julho, na capital argentina.

O festival traz gratas lembranças a Mercedes. Em 2013, ela venceu o prêmio de contos da BAN!, o que chamou a atenção do mercado editorial argentino e facilitou o lançamento de seu mais recente título, Mujer Equivocada, por lá. Leia abaixo a entrevista de Mercedes Rosende.

 

 
1. Você mal chegou a Montevidéu vinda da Semana Negra de Gijon, na Espanha, e já está fazendo as malas para o festival literário “Buenos Aires Negra” (BAN), agora no começo de agosto. Parece que a literatura policial está a mil por hora. Essa é a sua impressão?

Em agosto participarei da Buenos Aires Negra (BAN) e do Fórum Internacional de Fomento do Livro no Chaco, ambas atividades na Argentina. Depois participarei da Semana Negra de Montevidéu, organizada pelo Centro Cultural da Espanha, e da Semana Negra de San José, as duas no Uruguai. Não sei se a novela negra está a mil por hora. O que estão a mil por hora são os festivais, encontros e jornadas em torno da novela policial ou negra. Pensemos. Em minha casa sempre teve novelas policiais, supostamente era um gênero passadista, menor, inclusive recordo que ficavam um pouco escondidas, nas estantes menos visíveis da biblioteca, porém, ali estavam os europeus e os norte-americanos: Conan Doyle ou Chesterton, Chandler, Jim Thompson ou Graham Greene, entre outros. Ou seja, já estavam instalados no gosto dos latino-americanos. Me recordo especialmente da coleção Sétimo Círculo, que editavam Borges e Bioy Casares. Algum tempo depois a região começou a produzir seu próprio noir e, me animo a dizer, graças a um brasileiro que lhe deu estilo e dignidade literária: Rubens Fonseca. E hoje vivemos esta espécie de boom da novela policial e dos festivais.

 

345184“O livro tem uma personagem que adoro, Úrsula: mulher inteligente, frustrada, cheia de humor, de raiva, fobias e talentos; valente e impiedosa, terna e assassina serial.”
(sobre o livro Mujer Equivocada)

 

2. Alguns dizem que você é a primeira mulher uruguaia a escrever romances policiais. Este pioneirismo te afeta?

Eu não posso afirmar que seja a primeira uruguaia que escreveu policiais. Seria impossível certificar-se disso. Quem pode saber tudo que escreveram as uruguaias em 200 anos de vida independente do país e em outros tantos anos sob a dominação espanhola, portuguesa e brasileira? O que sei, e é bastante provável, que fui a primeira uruguaia a publicar novelas policiais, ao menos a primeira em publicá-las como tais, como novelas do gênero. Não sei de outras anteriores, nunca encontrei antecedentes. Mas não me considero uma pioneira, tampouco tive consciência de estar escrevendo “a primeira narrativa policial escrita por uma mulher uruguaia”. Simplesmente me sentei a escrever e começaram a aparecer os delitos, o crime, a corrupção, sem que eu me propusesse de antemão a isso. Só quando terminei de escrever, aí sim é que um amigo mencionou a possibilidade de que tenha sido a primeira a fazer algo do tipo.

3. A protagonista de seu último livro “Mujer Equivocada”, saiu de um relato que alguém lhe contou e que acabou lhe inspirando uma trama ficcional. O que você pode nos dizer sobre isso?

O livro tem uma personagem que adoro, Úrsula: mulher inteligente, frustrada, cheia de humor, de raiva, fobias e talentos; valente e impiedosa, terna e assassina serial. Porém Úrsula, sobretudo, é uma mulher gorda ou apenas com um sobrepeso, dependendo do estado de sua dieta de emagrecimento, é uma mulher que sofre e sofreu a discriminação e a burla por parte do mundo e de sua própria família. E a personagem surgiu sim de uma história que me contaram. Um dia conheci um homem que me falou de sua ex-esposa, a descreveu fisicamente, emocionalmente, me relatou algumas cenas que eu comecei a imaginar e, quando ele quis mudar de assunto, lhe pedi que por favor continuasse falando de sua ex-mulher. Naquele momento eu já tinha um personagem.

4. Há um outro romance policial seu cujo título me pareceu de uma força de atração extraordinária e ao mesmo tempo terrivelmente ameaçadora. Esse romance se chama “A morte terá teus olhos”. O que te parece?

Esse título “A morte terá teus olhos” eu retirei de um poema do escritor italiano Cesare Pavese. Na verdade, a trama desse romance – e a chave para resolvê-lo – está nesta frase, na qual me inspirei. No caso do título, o mérito é todo de Pavese. Esse título “A morte terá teus olhos” eu retirei de um poema do escritor italiano Cesare Pavese. Na verdade, a trama desse romance – e a chave para resolvê-lo – está nesta frase, na qual me inspirei. No caso do título, o mérito é todo de Pavese.
 

5. Você está escrevendo um livro novo neste momento?

Acabei de terminar a continuação de Mulher Equivocada, um romance que tem um título um pouco estranho: O Miserere dos Crocodilos, também inspirado num verso de um poema, desta vez de Júlio Herrera Reissig, um modernista uruguaio. E como sempre que termino um texto – seja um romance ou um conto – necessito de um tempo e paz, um tempo longe da escrita, de minha escrita. É o momento de submergir em todas as leituras que tenho atrasadas. No entanto, a mente trabalha silenciosa.x

(Imagens: divulgação, Laura Munoz em Semana Negra de Gijón)

 

ANÍSIO HOMEM é autor dos romances policiais “O Assassino que Mutilava Leminski” (Editora Letras Contemporâneas) e “O Diabo não Aperta Gatilho” (Editora Noite Escura).

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1 comentário em “Entrevista: Mercedes Rosende”

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