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William Gillette: 5 aspectos que transformaram o modo como Sherlock Holmes vê e fala

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Por Tom de Castella, BBC News – Um filme mudo de 1916 com Sherlock Holmes – que há muito tempo presumia-se estar perdido – foi lançado em Paris. É estrelado por um homem que mudou para sempre a forma como vemos o famoso detetive de Arthur Conan Doyle. Ele foi o primeiro intérprete de efeito de Sherlock Holmes, mas poucos devem ter ouvido falar do ator norte-americano William Gillette.

Acredita-se que ele tenha sido parente distante da família fundadora das lâminas de barbear Gillette, que tenha escrito peças de teatro sobre a guerra civil americana, patenteado um ruído que imitava o som de um cavalo a galope, e construído um castelo enorme em Connecticut. Mas as pessoas se fascinam mesmo quando seu é nome é associado ao de Sherlock Holmes. E até três meses atrás, parecia que ninguém jamais veria isso acontecer novamente.

 

 

Gillette adaptou Sherlock Holmes para os palcos em 1899, interpretando desde o detetive de Sir Arthur Conan Doyle mais de 1.000 vezes na carreira. Ele fez apenas um filme, a versão muda de 1916 intitulada “Sherlock Holmes”. Durante décadas, presumiu-se que estava perdido, um dos grandes elos perdidos dos estudos sherlockeanos. Então, em outubro de 2014, um arquivo de filme foi descoberto na Cinematheque Française em Paris.

 

“Finalmente, conseguiremos ver o ator que manteve a primeira geração de Sherlockians encantada”, disse o professor Russell Merritt, que vem pesquisando as origens do filme. “Em se tratando de Sherlock Holmes, não existe um ator vivo ou morto que não tenha consciente ou inconscientemente se inspirado em Gillette.”

 

Gillette não era apenas o Benedict Cumberbatch do seu tempo. Ele foi o ator que decidiu – talvez mais do que qualquer outro – como Holmes deveria olhar e falar, e cuja relação com Conan Doyle pode ter dado uma sobrevida à “franquia Sherlock Holmes”.

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Confira cinco contribuições de Gillette para criar o Sherlock que conhecemos hoje

 

1. Cachimbo arqueado: Dois adereços evocam Sherlock Holmes acima de todos os outros. O primeiro é o chapéu de caçador. As histórias de Conan Doyle nunca mencionaram o tipo de chapéu que ele usava – o modelo foi criado mesmo pelo ilustrador Sidney Paget, quando as histórias foram publicadas na Strand Magazine em 1891. O outro objeto crucial é o cachimbo. Não é um ornamento, mas uma parte do ritual dedutivo de Holmes.

Paget deu a Holmes um cachimbo de tubo reto, mas a peça de 1899 e o filme mudo de 1916 de William Gillette representaram uma mudança crucial. O eixo do cachimbo não estava mais em linha reta, mas sim curvado. “Assim, ele é capaz de dizer suas falas enquanto fuma o cachimbo. Se o cachimbo fosse mais tradicional, sua mão teria que ficar na frente da boca”, explica Alex Werner, curador do Museu de Londres que abriga a exposição Sherlock Holmes: O homem que nunca viveu e nunca morrerá. “O cachimbo arqueado ficou fixado ao imaginário popular e se tornou icônico”, diz Werner.

2. “Elementar, meu caro Watson”: a frase mais sherlockeana de todas – “Elementar, meu caro Watson” – nunca foi dita nos livros. Gillette é, talvez, o homem que mais chegou perto de articular a frase, embora ele nunca a tenha dito exatamente dessa forma. Na peça, ele escreveu: “Elementar, meu caro.” Em situações posteriores, trocou “caro” por “companheiro” ou “Watson”. O escritor PG Wodehouse recebe o crédito frequentemente pela frase completa em seu romance “Psmith, Journalist” (1915). Mas o Dicionário Oxford de Inglês questiona o dado. Parece que o termo já era utilizado em jornais antes do romance de 1915 escrito por Wodehouse. Então, mantém-se a incerteza quanto ao autor da frase completa.

Conan Doyle incluiu o termo “elementar” no vernáculo dedutivo de Holmes. Ele também incluiu “meu caro Watson”. Mas nunca usou tudo na mesma frase. Parece que Gillette quase colocou tudo junto. E outros, mais tarde, terminaram o trabalho. A frase “Elementar, meu caro Watson” provavelmente ficou famosa com a chegada dos filmes sonoros – já que foi usado em “The Return of Sherlock Holmes”, de 1929, estrelado por Clive Brook.

3. Roupão: Conan Doyle descreve o roupão de Holmes diversas vezes como “azul, roxo ou cor de rato”, de acordo com Roger Johnson, editor do Sherlock Holmes Journal. No entanto, isso é tudo que é informado. Johnson diz que o roupão de Gillette mudou ligeiramente o visual de Holmes: “Gillette tinha um esplêndido roupão, e alguns atores posteriormente adotaram roupas semelhantes.”

4. Ele moldou a forma de Sherlock para o público americano: Gillette foi o primeiro ator de teatro americano a assumir este papel profundamente inglês, dedicando-se ao sotaque com entonação superior. “Pode-se ouvir o mesmo tipo de sotaque quando Katharine Hepburn tenta falar de uma forma inglesa no filme ‘Uma Aventura na África’”, diz Johnson. O filme mudo de 1916 com Gillette, embora situado em Londres, foi produzido nos EUA. Ele também legou uma influência norte-americana para a aparência de Holmes. Em uma peça anterior, “Serviço Secreto”, havia algo do ídolo nele. Seu Holmes contrastava com o nariz proeminente e as maçãs do rosto de um Basil Rathbone, Douglas Wilmur ou Benedict Cumberbatch. Em comparação com o Holmes do seu tempo, o seu era “menos magro e adunco, com mais cabelo”, diz Johnson. “E mais bonito.”

No início do século 20, o ilustrador americano Frederic Dorr Steele desenhou Holmes para várias publicações norte-americanas. Seu modelo era Gillette. “Era assim que a maioria dos americanos achava que Holmes era. Considerando que, na Grã-Bretanha, a referência eram as ilustrações de [Sidney] Paget na revista Strand”, diz Johnson. E sua reputação continuou a crescer.

Calmo e carismático, é a forma como era descrito. Poucos viram o filme de 1916, mas até mesmo as fotos conseguem mostram a naturalidade que ele levou para o papel, diz Johnson. “Ele é maravilhoso. As pessoas dizem que ele é Sherlock Holmes”. Gillette era o rei da era do cinema mudo, mas quando o som chegou, foi a vez de um outro tipo de Holmes surgir. Para muitos fãs, hoje, é Rathbone quem se tornou e continua a ser o arquétipo do detetive.

5. Ele ajudou a inspirar Arthur Conan Doyle a voltar a escrever sobre Holmes: Conan Doyle matou Holmes em uma versão impressa de 1893. Uma adaptação para o teatro escrita por ele falhou em atrair atenção e sucesso, o que pode explicar a permissão para Gillette escrever a sua própria versão.

 

Quando o americano perguntou se no roteiro poderia fazer Holmes casar-se, Conan Doyle respondeu: “Você pode casá-lo, assassiná-lo, ou fazer o que quiser com ele”.

 

Ele parecia confiar implicitamente em Gillette, diz Werner. Eles se deram bem logo que se conheceram. De acordo com a biografia de Charles Higham, Gillette desceu de um trem vestido como Holmes antes de se aproximar da carruagem de Conan Doyle e examiná-lo através de uma lupa.

“Inquestionavelmente um autor”, ele anunciou, para a diversão de Conan Doyle. Mas havia um outro fator além da amizade – o dinheiro. “Acredito, porém, que há uma fortuna no outro – Sherlock Holmes,” Conan Doyle escreveu em uma carta datada de 18 de junho de 1899. “Gillette fez uma grande peça, e ele é um grande ator.”

Ele acreditava que estava destinado a ser um sucesso. Royalties teriam sido a principal motivação, mas havia também uma sensação de que poderia criar um novo interesse em ler os livros. “Tem uma propaganda inicial tão grande”, continuava a carta. “Eu não sou normalmente mais otimista, mas eu tenho grandes esperanças para isso. É o nosso trunfo”.

Conan Doyle começou a escrever “O Cão dos Baskervilles”, enquanto a peça estava em cartaz. Será que a peça sutilmente influenciou a forma como ele escreveu as histórias posteriores? Johnson acredita que não: “Algumas pessoas dizem que o personagem nas histórias posteriores não é o mesmo, mas eu não consigo identificar qualquer alteração.”

Qualquer que tenha sido o impacto estético, o sucesso da Gillette – este “trunfo” – teria tranquilizado Conan Doyle para o fato de que ainda havia um apetite do público por Holmes. Como ele escreveu quando leu primeira adaptação da peça: “É bom ver o meu velho amigo de volta.”

(Imagens: divulgação Cinematique Française, Henry Zecher)

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