Por Ana Paula Laux – Quem nunca ouviu falar em Sherazade, mulher sagaz e inteligente que teve a vida poupada narrando histórias fantásticas ao Rei Shariar? Clássico da literatura, o “Livro das Mil e Uma Noites” traz contos identificados a partir da segunda metade do século XIII, e voltou às livrarias em nova edição pela Biblioteca Azul (Globo Livros).
O livro começa com a decepção do Rei Shariar ao descobrir que sua mulher o traía com um escravo de seu palácio. Por vingança, o rei manda matar a mulher e o amante e decide ampliar a violência de seu ato: se casará com uma mulher durante o dia, passará a noite com ela e a matará na manhã seguinte. E assim se sucedeu por vários e vários anos. Até que, num belo dia, Sherazade se colocou em seu caminho.
Filha do vizir, ela praticamente implora para que seu pai a ofereça ao rei em casamento. Contrariado, o conselheiro do rei resiste até não poder mais, certo de que a filha terá o mesmo destino fatal das outras esposas, ou seja, será degolada após a noite de núpcias. Mas, aparentemente, o vizir não contava com a astúcia da própria filha, que bola um plano mirabolante para escapar da alma vingativa do soberano.
Sherazade passa a contar histórias fantásticas noite após noite para o rei, sempre as interrompendo no momento em que vai revelar algo importante e surpreendente (mas é claro que ela não conta o que é). Assim deixa-o profundamente curioso dizendo que só vai terminar a história na noite seguinte, fazendo com que o rei poupe sua vida por mais um dia. E ela segue vivendo por conta da imaginação.
“na próxima noite, se eu viver e o rei me preservar… vou lhes contar a continuação, que é mais admirável e espantosa”.
Como é uma coletânea de histórias populares, há temas e personagens variados, como gênios, ifrits (espécie de demônio), mágicas, bruxas, maldições, animais e cidades encantadas, gente se transformando em bicho, bicho se transformando em gente e por aí vai. Chama a atenção a violência naturalizada contra a mulher desde sempre, presente em vários momentos como ferramenta de punição ou controle. Algumas expressões também são curiosas, como quando uma ideia ou vontade deve ser reforçada, aquilo torna-se algo “absolutamente imperioso”.
É um livro para ler com calma, feito para saborear cada conto devagar. Esta edição é apenas o volume 1, que segue até a história número 170. Outra nota importante é que o trabalho do tradutor, Mamede Jarouche, ganhou vários prêmios literários, entre eles o Jabuti de Melhor Tradução nessa primeira versão integral do árabe para a nossa língua. Segundo dizia Jorge Luis Borges, o “Livro das Mil e uma Noites” tem o título mais lindo de toda a literatura. E as histórias são mesmo uma viagem admirável no tempo.
Título: Livro das Mil e uma Noites – Volume 1
Autor: Vários autores
Tradução: Mamede Mustafa Jarouche
Editora: Biblioteca Azul
Páginas: 464
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SINOPSE – Primeira tradução integral e direta do árabe para o português, o “Livro das mil e uma noites” retorna às livrarias com novo projeto gráfico, numa edição revista e atualizada pelo tradutor Mamede Mustafa Jarouche. Vencedor dos prêmios APCA, Paulo Rónai e Jabuti de melhor tradução, o “Livro das mil e uma noites” é uma obra universal que atravessou séculos fazendo parte da cultura do Oriente e do Ocidente. Mais do que um rico repertório de narrativas fantásticas, é também uma homenagem à mulher e um reconhecimento de sua inteligência. Sua heroína, a narradora Šahräzäd, é um símbolo da infinita capacidade feminina de contornar situações críticas e de salvar o mundo da ruína. “[…] Antes da primeira noite, o leitor sabe que o rei Šähriyär foi traído por sua mulher, e que esta traição pode ceifar a vida de todas as mulheres do reino. Mas Šahräzäd decide arriscar sua própria pele a fim de salvar as outras mulheres. Então, começa a contar histórias ao rei. Em cada amanhecer o relato é interrompido num momento de suspense, à espera da próxima noite. Assim, o leitor se depara com tramas ardilosas e escabrosas, cheias de fantasia e surpresa, numa geografia mutável e exuberante como num sonho ou pesadelo. O inverossímil e o inexplicável participam dessas intrigas, que a imaginação da narradora multiplica e expande até a última noite, quando se casa com o rei e salva as mulheres da degola. É esse “repertório de maravilhas” que o leitor vai encontrar nas fábulas do Livro das mil e uma noites.” (Milton Hatoum)
Jornalista. Trabalha com curadoria de informação, gestão de mídias sociais e criação de conteúdo digital. Em 2014, lançou o e-book “Os Maiores Detetives do Mundo” (Chris Lauxx). Contato: [email protected]
Muito legal essa edição!
Em que obra, site ou artigo o Milton Hatoum fala sobre As Mil e Uma Noites?