Por Leila Gonçalves – O brilhantismo da obra de Fiodor Dostoiévski (1821-1881) é indiscutível, assim como sua influência sobre grandes escritores como Proust, Faulkner e Camus. Entretanto, não é tão fácil apontar seu melhor livro. Entre alguns títulos, “Crime e Castigo” está entre os favoritos além de ser um dos mais conhecidos.
Com contornos detetivescos, sua história narra a investigação de um duplo homicídio conduzida por um astuto investigador. Para o crítico Harold Bloom, trata-se do melhor romance de suspense já escrito, uma leitura angustiante cujo assassino vive atemorizado com a possibilidade de ser descoberto.
Também é uma boa escolha para apreciar um “romance polifônico” por excelência, assim denominado pelo filósofo Mikhail Bakhtin em seu livro “O Problema da Poética de Dostoiévski”. Em “Crime e Castigo”, cada personagem atua livremente de acordo com seu ponto de vista, voz e postura no contexto em que está inserido, apontando para uma profunda compreensão da alma humana por parte do autor.
Por exemplo, seu protagonista, Raskólnikov, é um ex-estudante imbuído de ideias bizarras de grandeza que está decidido a sair da pobreza. Para tanto, ele mata uma velha gananciosa, dona de uma casa de penhores, com o intuito de roubar seu dinheiro. No entanto, ao colocar em prática seu plano, é “obrigado” a tirar a vida de uma testemunha. Trata-se de uma pobre coitada que é meia-irmã da vítima, o que coloca em xeque sua justificativa. Influenciado por doutrinas mal digeridas vindas da Europa ocidental que começavam a ganhar corpo na Rússia czarista, Raskólnikov e sua “teoria do homem extraordinário” é o oposto de Dostoiévski, um cristão ortodoxo fervoroso, que constrói o personagem com total isenção de valores.
Os anos vividos pelo escritor exilado na Sibéria marcaram indelevelmente “Crime e Castigo”. Seu protagonista foi inspirado num líder dos prisioneiros chamado Orlov, com quem conviveu. Em síntese, a degradação social e psicológica é o foco de seus livros e algumas vezes, em meio dessa mediocridade também gravita uma nobreza rara e poderosa, nesse caso, ilustrada por Sônia, uma prostituta em busca do sustento da família, que indica o caminho da fé como redenção para Raskólnikov.
“A pobreza e a miséria formam o artista.”
(Fiodor Dostoiévski)
Com quase seiscentas páginas e apresentando um retrato fascinante de São Petersburgo, essencialmente o livro discute o sofrimento humano através de uma impecável abordagem sobre o materialismo e a fé, a culpa e o perdão, deixando claro que o crime não compensa.
Nota: Essa edição é a primeira traduzida diretamente do russo para o português. De acordo com Elena Vássina, professora de Literatura e Cultura Russa da USP, Paulo Bezerra conseguiu capturar o estilo carregado de cores fortes que marca a escrita de Dostoiévski.
SOBRE O LIVRO
Título: Crime e castigo
Autor: Fiodor Dostoiévski
Editora: 34
Páginas: 568
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SINOPSE – Publicado em 1866, Crime e Castigo é a obra mais célebre de Fiódor Dostoiévski. Neste livro, Raskólnikov, um jovem estudante, pobre e desesperado, perambula pelas ruas de São Petesburgo até cometer um crime que tentará justificar por uma teoria: grandes homens, como César e Napoleão, foram assassinos absolvidos pela História. Este ato desencadeia uma narrativa labiríntica que arrasta o leitor por becos, tabernas e pequenos cômodos, povoados de personagens que lutam para preservar sua dignidade contra as várias formas da tirania.
Doente por livros, vem sendo tratada sem resultado há mais de cinquenta anos pelo alienista Simão Bacamarte. Aposentada e com tempo de sobra, parece haver pouca esperança em sua recuperação. Sem formação acadêmica na área e nenhuma foto de identificação, pode ser facilmente encontrada entre os detetives e vilões da ficção policial, em geral, com um e-book na mão.
Comentar obra prima é sempre arriscado. Parabens. Apenas para lembrar: o esperto juiz de instruções de Crime e Castigo – Porfiri Petrovich – renasceu como personagem seriado. Autor: R (Roger) N Morris, Estados Unidos, 1960. Foram publicados quatro livros com o herói: The Gentle Axe, 2007; A Vengeful Longing, 2008; A Razor Wrapped in Silk, 2010 e The Cleansing Flames, 2011. Em português: O Machado Gentil (Planeta do Brasil, 2007). Óbvio que nada tem com o autor russo mas é bem escrito e prende o leitor. Qual o melhor livro de Dostoievski?
Agradeço sua informação que desconhecia. Boas sugestões de leituras que certamente, incluirei em minha lista.
Quanto ao melhor livro, aprecio “Memorias de Subsolo”, mas acabei de ler “Os Irmãos Karamazov” e estou completamente apaixonada pelo romance.
Preciso ler esse livro! Amei a resenha.
Nunca li nenhum livro do autor, mas já recebi várias indicações.
Beijos
http://lovelyplacee.blogspot.com.br/
Um clássico! Sempre penso que histórias bem contadas nunca envelhecem. Beijos!
Leila,
Eu li esse livro e a minha interpretação foi apenas em cima do Raskólnikov e a sua mania de grandeza. Confesso que o detetive responsável ficou em segundo plano, porém, ao ler a sua resenha consegui lembrar dele e das vezes que interrogou o estudante, aliás, de forma brilhante. Há um filme que fica muito destacado a atuação do detetive.
Parabéns pela resenha.
Wilson Brancaglioni
Fico feliz que tenha gostado. Abraços.
Bela crítica. Há poucas pessoas dispostas a escrever a respeito de um clássico de tamanha envergadura. Ademais, considero este o melhor romance policial de todos os tempos. Sempre procuro revisá-lo e o sabor é sempre o mesmo: prazer literário. Abraço!
Grata pela leitura e a dica. Na minha opinião, apesar de não ter lido toda a obra do escritor, seu melhor livro (até agora) é “Notas do Subsolo”. Apresentando um protagonista sombrio, trata-se de um texto complexo, cético e extremamente perturbador.