Por Rogério Christofoletti – O Robert Langdon do cinema está envelhecendo. Já não traz as fartas madeixas de “O Código Da Vinci” (2006) nem a vitalidade exibida em “Anjos e Demônios” (2009). Também! Já se passaram dez anos desde que Ron Howard passou a transpor para a grande tela os romances de Dan Brown em que o acadêmico de Cambridge cruza o mundo revelando mistérios aterradores e livrando a humanidade de destinos terríveis.
Mas o recém-lançado “Inferno” – dirigido pelo mesmo Ron Howard – nos mostra que a idade está chegando para o personagem: as rugas se espalham pelo rosto em super closes, a testa está mais pronunciada que nunca, e o tronco e braços, mais flácidos.
Sim, o homem acabou de sair de uma cama de hospital e ainda está grogue com os medicamentos, mas o cansaço e o abatimento não vão abandoná-lo ao longo das quase duas horas de filme. E talvez esteja aí um sinal do andamento das coisas. Langdon está exausto e a experiência de seguirmos com ele em suas aventuras também esteja próxima do esgotamento.
Se comparado às produções anteriores, “Inferno” é mais sério, soturno e perturbador
Na trama, o professor acorda num hospital com um ferimento na cabeça e sem se lembrar do que viveu nas últimas horas. Pensa em estar nos Estados Unidos, após um compromisso profissional e ter passado mal. Percebe, confuso, que está a milhares de quilômetros de lá, na italiana Florença, e que levou um tiro de raspão na cabeça. Mal se recobra do susto, e uma policial invade o hospital atirando em tudo o que vê pela frente.
Langdon foge desesperado com uma médica local e descobre um dispositivo que liga os círculos do inferno de Dante Alighieri a uma teoria maluca do cientista Bertrand Zobrist para resolver os problemas de superpopulação no planeta.
Colocadas as cartas na mesa e se você já leu Dan Brown ou conferiu alguma das adaptações para o cinema, já sabe mais ou menos o que vem pela frente: conspirações e segredos mortais, reviravoltas e traições, paisagens alucinantes em diversos países, perseguições e muita correria. “Inferno” não renega esse modelo – que para o escritor funciona como fórmula de sucesso -, mas a aventura fica bem aquém das anteriores.
A ameaça enfrentada é global e pode levar a um desastre sem precedentes na história da humanidade. E embora maluca, a ideia do cientista atrai adeptos fanáticos que acreditam no apocalipse do desordenado crescimento populacional, coisa pensada no século 18 por Thomas Malthus. O inferno não é um deserto, é o contrário. É gente demais, espalhando doenças demais, destruindo o planeta de forma acelerada, com comida, ar puro e água de menos. Este é o inferno de Zobrist.
Para o erudito Langdon, o inferno tem a cara que Botticelli deu a partir de Dante, e que muitos de nós ainda cultiva no inconsciente
Por isso, as alucinações do professor são horríveis e apavorantes. As cenas nos deixam muito mais perto da leva de filmes sobre apocalipses zumbis que das gincanas de história da arte a que estávamos acostumados com Langdon.
Nosso herói está mais velho, parece mais cansado e suas esperanças se desvaneceram. Ele quer salvar o mundo de novo. Mas sua motivação parece estar mais no resgate de um amor do passado que não se realizou do que no bom-mocismo e na preocupação de preservar riquezas artísticas.
Por falar nisso, “Inferno” oferece raríssimas ocasiões em que o intelecto privilegiado de Langdon se sobressai ou mesmo cenas em que somos brindados com pequenas aulas de história medieval, simbologia e refinamentos artísticos. Os adaptadores passaram a faca nesse aspecto, e algumas cenas da história foram resolvidas de forma tão apressada que ficaram bem desfiguradas. Note, por exemplo, o que ficou de Veneza no filme. Aquela paragem parece gratuita e descartável. No livro, nem tanto… Temos menos arte, menos correria e menos charme em “Inferno”. Por outro lado, as locações são muito bem escolhidas e os efeitos visuais são de cair o queixo. Tom Hanks despeja uma carga dramática não exagerada, como em outros momentos da carreira, e Langdon se mostra para além do terno de tweed e da falação característica de professor.
Para o filme, falta um bom tema musical, que poderia ajudar na costura de partes esgarçadas no roteiro, esse sim, com oscilações de ritmo. “Inferno” se afasta bastante das aventuras que o precederam, mas ainda diverte. Mas por uma questão de justiça, e após Langdon ter passado o diabo, talvez seja a hora de o herói descansar…
Jornalista, dramaturgo e professor universitário. Já publicou 12 livros na área acadêmica e escreveu oito peças de teatro. É um dos autores do e-book “Os Maiores Detetives do Mundo” (Chris Lauxx).
Assistirei este filme hoje. Não tenho uma visão tão esclarecedora como a sua, mas ainda assim espero apreciar. Obrigado pelas dicas. Abraço!
Espero que tenha gostado… e aí? O que achou?
Obrigado por perguntar Rogerio. O filme realmente não se prendeu ao tema que me levou a crer tratar-se de algo místico e religioso, mas que se mostrou apenas científico, deixando uma incógnita no ar. Quem seria o responsável pelas pragas? Deus ou o homem? E quanto a lógica dos acontecimentos, vimos apenas tratar-se de interesses industriais e nada de motivos religiosos. É, poderia ter sido mais dramático e catastrófico, não sei. O suspense se sustenta durante um tempo mas falta continuidade para um clímax melhor. Mas fazer o quê? Achei no geral médio para fraco. Abraço!
Realmente partes do livro ficaram faltando, mas a história e a essência foi colocada.
Achei a escolha da atriz ruim. Ela não tem expressão nenhuma. No caso da apatia dele, tudo se realizou em 24 horas então é compreensível.
E não achei que foi um resgate amoroso. Achei ótimo no todo.
Também achei a atriz pouco expressiva… já a chefona da OMS…