Em Tudo o que nunca contei, Celeste Ng foca no aspecto pessoal dos personagens

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Por Yasmin Lahm – Na célebre frase que abre o clássico Anna Karenina, Leon Tolstói declara que “todas as famílias felizes são iguais. As infelizes o são cada uma à sua maneira”. Esta máxima poderia servir como slogan de venda para o livro “Tudo o que nunca contei”, romance de estreia de Celeste Ng.

Celeste Ng é uma escritora norte-americana filha de chineses que imigraram para os Estados Unidos na década de 1960. Sua história pessoal e familiar enquanto filha de imigrantes é central para a compreensão da trama de sua primeira obra, que trata de temas delicados como a adaptação à vida em um país estrangeiro, o dilema de abandonar sua identidade em nome da aceitação pela sociedade e os preconceitos e microagressões sofridas pelos representantes de minorias.

Em “Tudo o que nunca contei”, adentramos o cotidiano pacato da família Lee, abruptamente interrompido pelo desaparecimento da filha do meio do casal, a adolescente Lydia. Certa manhã, ao chamar a filha para tomar o café da manhã, a matriarca Marilyn encontra sua cama intocada e o quarto sem sinal da filha, que não é vista desde o dia anterior.

Segue-se a isso um período de apreensão em que a polícia é notificada de seu desaparecimento e se dá início a buscas pela jovem, que logo se mostram infrutíferas – o corpo de Lydia é encontrado no fundo do lago próximo à residência dos Lee, lago este em que a adolescente, ao contrário do restante da família, não tinha o costume de nadar, pois tinha medo da água. O que – ou quem – teria levado Lydia a se aproximar de suas águas e encontrar seu derradeiro destino?

Soma-se a essa situação as cobranças tipicamente enfrentadas por adolescentes, a competição natural entre irmãos e a já conhecida narrativa da família que exibe uma fachada de “comercial de margarina” mas que esconde muitas frustrações e ressentimentos.

Em linhas gerais, é este o enredo do livro. Entretanto, em se tratando de “Tudo o que nunca contei”, é importante ressaltar o que não esperar da história. Não se trata de um romance policial clássico aos moldes do whodunnit – se você está em busca de um livro com desfecho ao estilo “foi o Coronel Mostarda, na biblioteca, com o candelabro”, melhor ler outro. Celeste Ng foca o drama de seu romance no aspecto pessoal dos personagens, não na busca por um culpado pelo crime. Pode-se identificar uma afinidade com a obra de Patricia Highsmith, em que a atmosfera psicológica domina a narrativa, e na contemporânea Gillian Flynn, que em “Lugares escuros” explora as fragilidades e segredos de uma família que, assim como os Lee, se conhece menos do que imaginava.

Nesses tempos sombrios em que vivemos, em que xenofobia e racismo estão presentes em toda parte, um livro como “Tudo o que nunca contei” faz um retrato sensível e realista da vida de uma família asiática no coração dos Estados Unidos, com todo o ônus que isso acarreta. Apesar da trama se passar na década de 1970, o tema permanece incomodamente atual e encontra na prosa de Ng um excelente veículo para ser divulgado e discutido.

* Livro enviado para o blog pela Editora Intrínseca.

 

Título: Tudo o que nunca contei
Autora: Celeste Ng
Tradução: Julia Sobral Campos
Editora: Intrínseca
Páginas: 304
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SINOPSE – Na manhã de um dia de primavera de 1977, Lydia Lee não aparece para tomar café. Mais tarde, seu corpo é encontrado em um lago de uma cidade em que ela e sua família sino-americana nunca se adaptaram muito bem. Quem ou o que fez com que Lydia — uma estudante promissora de 16 anos, adorada pelos pais e que com frequência podia ser ouvida conversando alegremente ao telefone — fugisse de casa e se aventurasse em um bote tarde da noite, mesmo tendo pavor de água e sem saber nadar? À medida que a polícia tenta desvendar o caso do desaparecimento, os familiares de Lydia descobrem que mal a conheciam. E a resposta surpreendente também está muito abaixo da superfície.

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