Pai e filho King, as Belas Adormecidas e uma premissa mal aproveitada

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Por Rodrigo Padrini – Algo que aprendi desde que adquiri o hábito da leitura, é que não precisamos amar todos os livros escritos por um determinado autor. Por mais que pronunciemos aos sete ventos ‘Eu amo o Simenon’ ou ‘Jo Nesbø é o maioral’, algumas histórias não correspondem às nossas expectativas. Estamos falando de um desses casos? Sim, estamos.

Belas Adormecidas (Suma, 2017) é um baita tijolo escrito pelo mestre foda do suspense e do terror Stephen King em parceria com seu filho Owen King. Pai e filho King, nesse caso, trazem até nós a surreal experiência de um dia todas as mulheres do mundo começarem a dormir envoltas em casulos bizarros e simplesmente não acordarem. Uma espécie de ‘doença do sono’ que só afeta as mulheres – em escala mundial, apesar de vivenciarmos apenas a experiência de uma cidadezinha do interior – é a grande premissa do livro.

Mas será que basta uma boa premissa para que uma história seja envolvente, divertida e bem executada? Nem sempre. King – os Kings, nesse caso – escreve bem, é inegável. Não há como simplesmente dizer que está ruim e não está legal. Pelo contrário, os personagens de ‘Belas Adormecidas’ são bem construídos. Lila e Clint Norcross, Frank Geary e Terry Combs são bons exemplos. Rendem algumas risadas e alguns suspenses.

Os cenários são bem detalhados e todo o universo que serve de pano de fundo para o caos gerado com o cochilo da mulherada é extremamente característico de Stephen King, ou seja, uma bela cidade do interior americana, com uma galera mais urbana, outra mais caipira. Ademais, grande parte da história se passa em uma prisão feminina, o que também é bem interessante, principalmente por se tratar de um mundo pouco conhecido e ilustrado. Os autores trabalham bem essa parte.

 

Porém, será difícil defendê-los dessa vez. ‘Belas Adormecidas’ tem mais de 700 páginas, mas poderia ter menos de 300, ou mesmo virar apenas um conto. A premissa é boa, mas toda a história construída em torno dela não convence e poderia ser algo bem diferente.

 

Os elementos sobrenaturais como ´Evie Black´ – uma espécie de bruxa bonita rainha da natureza e dos animais – e ‘A raposa’, que protagoniza alguns trechos do livro, não foram fáceis de engolir. O mundo do outro lado da árvore, os animais que se comunicam, os ratos que obedecem à rainha da natureza que ninguém sabe de onde veio, tudo isso ficou só estranho mesmo. O ‘mundo sem homens’ e toda aquela coisa de ‘os homens que são agressivos e responsáveis pelas guerras e todos os problemas da humanidade’ também não foram suficientemente explorados ou mesmo devidamente argumentados, por mais que possa ser verdade.

Claro, não esperava ler nenhum artigo científico. Pelo contrário, estamos lendo ficção aqui pessoal. Mas, mesmo uma ficção que pretende abordar algo tão próximo da nossa realidade, deve buscar convencer o leitor e sugá-lo para o seu universo, em minha opinião. O que, tendo em vista tudo o que eu disse até agora, não aconteceu.

A partir do momento em que ultrapassei a página 500 e até chegar ao fim do livro, me senti escalando uma montanha sem equipamento adequado. O fim simplesmente não chegava, mas o livro já tinha acabado pra mim. O desfecho de tudo é razoável, e um pouco óbvio. Ao longo do livro, diversos acontecimentos vão se acumulando para dar à história um toque caótico, mas infelizmente apenas cansam o leitor porque acrescentam muito pouco ao resultado final.

Apesar de gostar muito de Stephen King, e de todos os livros os quais resenhei por aqui, não indico a leitura de ‘Belas Adormecidas’. Indicaria se fosse um conto ou um livro de 300 páginas, como disse anteriormente. Mas, no atual formato ‘tijolo’, não acho que a experiência traga satisfação ao leitor. É muita narração e pouca efetividade, o que lembra apenas um exercício de escrita algumas vezes, algo ainda inacabado. Quanto à edição e à tradução, nada a reclamar, tudo nos conformes.

De qualquer forma, King não se dispensa e você, leitor, pode ter uma experiência totalmente diferente da minha. Portanto, se você estiver curioso para saber o que pai e filho King arrumaram a partir de uma premissa realmente interessante, vá em frente e vamos discutir o que deu certo ou errado dessa vez. Se você está pensando ‘Então porque diabos eu li essa resenha’, pense que, se você quiser ler mais um King ou mesmo iniciar sua amizade com o autor, talvez esse título não seja o mais indicado.

Título: Belas Adormecidas
Autor: Stephen King e Owen King
Tradução: Regiane Winarski
Editora: Suma
Páginas: 728

SINOPSE – Pelo mundo todo, algo de estranho começa a acontecer quando as mulheres adormecem: elas são imediatamente envoltas em casulos. Se despertadas, se o casulo é rasgado e os corpos expostos, as mulheres se tornam bestiais, reagindo com fúria cega antes de voltar a dormir. Em poucos dias, quase cem por cento da população mundial feminina pegou no sono. Sozinhos e desesperados, os homens se dividem entre os que fariam de tudo para proteger as mulheres adormecidas e aqueles que querem aproveitar a crise para instaurar o caos. Grupos de homens formam as “Brigadas do Maçarico”,incendeiam em massa casulos, e em diversas partes do mundo guerras parecem prestes a eclodir. Mas na pequena cidade de Dooling as autoridades locais precisam lidar com o único caso de imunidade à doença do sono: Evie Black, uma mulher misteriosa com poderes inexplicáveis. Escrito por Stephen King e Owen King, Belas Adormecidas é um livro provocativo, dramático e corajoso, que aborda temas cada vez mais urgentes e relevantes.

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4 comentários em “Pai e filho King, as Belas Adormecidas e uma premissa mal aproveitada”

  1. Alessandro Yuri Alegrette

    Também não gostei deste livro, para mim é um dos mais fracos do autor. A parceria com seu filho não funcionou. A mistura entre os acontecimentos no presídio com o evento extraordinário não deu liga. O elemento fantástico aqui me pareceu totalmente inverossímil. Se for analisado com profundidade, infelizmente se chega à conclusão que não tem nenhum fundamento ou justificativa.

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